Páginas

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Minha Mãe

Na minha infância e pré-adolescência eu não era chegada a certas comidas. Melhor dizendo, a muitas comidas. Minha mãe só faltava enlouquecer com o trabalho que eu dava a cada refeição.
– Não quero carne, tem gordura!
– Não gosto desse molho!
– Não quero feijão!
– É feijão verde!
– Mas tem maxixe!
O meu pai só piorava a situação para ela. Como não queria me ver chorar, sempre procurava mandar fazer uma comida especialmente para mim. O que significava não ter nada que levasse carne vermelha, feijão, verdura ou legume. No meu cardápio só entrava mariscos, massas, frango ou ovo, leite com chocolate, pão, queijo e frutas. No dia que não tinha o que eu gostava, pedia para tomar um copo de leite com chocolate. Mamãe havia criado 10 filhos comendo tudo, sem direito a reclamar. Mas, éramos dois contra uma, e eu, a caçula, então, mesmo a contragosto ela abriu uma concessão.
Um dia – eu devia ter uns 10 anos –, meu pai estava viajando, e mais uma vez eu não quis o que havia na mesa. Mamãe até tentou não me forçar comer, mas para eu não ficar sem me alimentar, preparou o que ela chamava de “ovo morno” – dizia ser um alimento forte e saudável –, e o que para mim era ovo cru, mal dava tempo da água ferver. Chegou com uma xícara e disse:
– Toma!
Peguei a xícara na mão, olhei o conteúdo, e falei com a voz trêmula:
– Não gosto!
– TOMA! Engole de uma vez só!
Levei a xícara à boca e realmente engoli aquela gororoba o mais rápido que pude. Mas meu estômago não gostou nada daquilo. Na mesma hora mandou de volta. E minha mãe gostou menos ainda do que viu. Pela primeira e única vez em toda minha vida ela me deu uma palmada. Não teve força física naquela palmada, mas a força da reprovação do que eu havia feito, foi forte e doeu muito. Levantei para me lavar e, em seguida fui para o meu quarto chorar. Tranquei a porta e ali fiquei a tarde inteira sem querer vê-la. Aquela situação era nova, nunca havíamos chegado a tanto desentendimento.
Anos depois fiquei adulta, passei a gostar de verduras, legumes e outras comidas que não suportava.
Nunca mais eu e minha mãe tivemos outro desentendimento que chegasse a deixar uma das duas triste. Foi muito amor, respeito e compreensão. Mesmo ela sendo Mãe, não invadia minha particularidade, e eu percebia como ela gostava porque eu agia da mesma maneira. Isso a dava confiança, e ela me fazia confidências. Não tentávamos mudar a outra, podíamos dar conselhos, mas nada de forçar a barra para que fossem aceitos. Não me lembro de sair da casa dela irritada com algo que ela tinha dito ou feito. Também não lembro de tê-la deixado irritada. Gritar uma com a outra? Fora de cogitação. A verdade é que, amávamos tanto a maneira de ser uma da outra que, os defeitos ficavam no fim da fila.
Beatriz Napoleão 

2 comentários: